É engraçado que todo mundo fale do Diogo, mas o meu Mainardi preferido, na verdade, é o pai dele.
Dele o filho parece ter herdado, além do talento para escrever um texto atraente, uma certa vocação para a polêmica. Não vou entrar nesse mérito.
Para quem não sabe, o Enio Mainardi foi o dono da Proeme, uma das agências mais brilhantes, mais instigantes dos anos 70. Publicitários mais novos gostam de se referir àqueles tempos com um certo desdém. Mas os anos 70 foram, talvez, os anos mais criativos da publicidade brasileira. Foi a década em que a DPZ recriou a propaganda brasileira moderna (depois da Almap), em que apareceu o Washington Olivetto e em que o Neil Ferreira foi um dos grandes mestres.
Em vez de copiar o One Show, o NY Art Director’s Annual ou o British D&AD, publicitários em formação deveriam ler os anúncios nos anuários do Clube de Criação de São Paulo dessa época. Pelo menos aprenderiam a escrever mais de 3 parágrafos. Saberiam o que é impacto de verdade, o que é raciocínio, e que propaganda não deveria se restringir a um tiquinho de informação e uma gag no final.
Nesse panorama brilhante uma das grandes estrelas foi o Enio.
Segundo o mercado, o Enio é louco. Dizem que ele anda de cuecas na agência, que é chegado a dar uns tiros, que é uma pessoa difícil. Sem dúvida foi, ao mesmo tempo, o maior chamariz e o maior entrave de sua agência.
Mas o sujeito era um gênio. Alguns dos conceitos que ele criou para a propaganda de alguns produtos permanecem até hoje. Alguns exemplos:
Tostines vende mais porque é fresquinho? Ou é fresquinho porque vende mais?
Jurema. A natureza em água e sal.
Bonzo. Não é ração, é refeição.
Cica. Ponha um elefante na panela.
Óleo Lisa. Você só sente o cheiro da comida.
Old Eight. O bom whisky você conhece no dia seguinte.
Smirnoff. A bebida invisível.
Mais que bons anúncios e bons comerciais, são esses conceitos que fazem uma marca sobreviver. São elas que dão o esteio à linha criativa de uma campanha, duas, dez. Um bom conceito pode durar anos.
Hoje chamam isso de vários nomes diferentes. Uns chamam de branding, e dizem que vai ser a grande tendência do futuro. Outros, de posicionamento. No tempo do Enio, isso se chamava pura e simplesmente propaganda.
De quaquer forma, os tempos do Enio passaram. Não que a propaganda que ele fazia tenha ficado ultrapassada; mas redatores têm vida curta, não chegam aos 50 anos. Depois disso é melhor que tenham se tornado diretores de criação (e deixado de criar anúncios), de planejamento ou de sua própria agência.
Mas a última polêmica mainardiana de que me lembro tem pouco tempo, o que talvez coloque água nessa minha teoria. Foi quando o Enio partiu da campanha “Eu sou da paz” e criou uma série de anúncios para o lobby da indústria de armas mostrando um bandido e a frase: “Você é da paz, ele não”. O pessoal que criou a campanha original reclamou. Eu não vejo razão. É uma campanha perfeitamente legítima. E se me permitem o trocadilho infame, no alvo.
Mas o Enio, como se sabe, é um dinossauro que não sabe mais nada.