A Gi falou certo, não dá para comparar humanos e animais — e isso, na minha opinião, invalida o argumento do Lucas Murtinho de que a diferença do post para um artigo nazista é só de escala. O mundo é bem mais complexo do que isso.
Eu recomendaria que o Lucas lesse este post.
Mas dá para estabelecer prioridades. E nesse caso, a opinião da Leila, para mim, é definitiva.
O Tiago Santos usou um argumento interessante, mas partiu de um equívoco. Para começar, generalizou coisas que eu não generalizei, e a maioria da sua argumentação parte desse princípio falso. A crítica inicial foi à ONG específica que tinha “feito” aquilo; o Piotr corrigiu a informação, mas a crítica se mantém àqueles indivíduos e a todos aqueles capazes de fazerem uma coisa dessas, que são um segmento importante — e certamente o mais chamativo — desse movimento. Eu não sei com que cara esse pessoal debilóide diz que defende os bichinhos quando é capaz de inflingir golpe tão baixo em outros animais, por acaso humanos. Isso é hipocrisia, amiguinhos. É preciso, pelo menos, ter uma medida mínima das coisas.
Outros argumentos do Tiago (você é advogado, Tiago? Só o pessoal que mexe com direito diz que “a Constituição é sensível” a algo) são igualmente demagógicos:
Certamente há pessoas de classe média ou alta que não tem mais o que fazer, e certamente seus atos não estão ligados à defesa de animais, estão mais para alguns de seus membros em porem fogo em animais e gente, gente como o índio Pataxó Galdino Jesus dos Santos, morto em 1997.
Como dizia um grande filósofo, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. A sacralização daquela corja a partir da comparação com criminosos é fácil demais, sugere pontos falsos de contato. Mas elas continuam pessoas de classe média e alta que não têm o que fazer.
(Parêntesis para o Galdino: é engraçado como as pessoas funcionam em função da mídia. O caso do Galdino só é citado até hoje porque foi um índio a virar churrasquinho, e não um mendigo. As pessoas não percebem o significado da frase de um dos marginais: “A gente não sabia que era um índio, pensava que era um mendigo”, e continuam com sua indignação localizada e parcial, que não tem mais conseqüências que umas poucas manchetes de jornal. Em Brasília, em Salvador as pessoas vêm queimando regularmente mendigos desde que me entendo por gente. Ninguém cita esses casos com tanta superioridade moral. Porque são mendigos. Porque valem menos que um índio, certamente, e talvez menos que bichinhos. A escolha do caso Galdino em vez dos mendigos mortos a porrete em São Paulo, recentemente, é curiosa. É mais fácil se indignar com um índio morto — que é um caso atípico — que com um problema [ou sintoma] social antigo e persistente. Coisas de Pindorama.)
E eu não pretendi me solidarizar com a Gloria Pérez. Duvido que ela precise disso. A intenção era outra e mais simples: chamar pelo nome os retardados que fizeram aquilo. Como dizia outro filósofo, “mal feito é da conta de todos nós”. Eu esperava que pelo menos isso ficasse bem claro. É bem provável que tenham sido os mesmos idiotas que foram às ruas pedir a pena de morte quando a Globo fez aquela campanha de salvamento do próprio rabo depois do assassinato da Daniela Pérez. Gente que não pensa e não conhece os limites e implicações de qualquer ação social.
Sinceramente, eles me importam pouco. Acho algo pequeno e socialmente irrelevante. São só bobões barulhentos, que apenas depõem contra ações sérias como a do Projeto Tamar (que não ignora o elemento humano nem imagina a luta ambiental como um pretenso choque entre bichos e humanos). Esse tipo de coisa, em si, me importa pouco, mas a dimensão humana de alguns atos me interessam.
Minha visão do mundo é antropocêntrica, sim. Vai ser sempre. Posso me dar ao luxo de achar que as posições dos defensores dos animais são um outro lado dessa mesma moeda antropocêntrica. Eles gritam pelo mico-leão dourado porque isso os faz sentir mais humanos. Acham que se fossem animais estariam pouco se importando com os outros. Não se importariam de comer a mãe de um filhote novo. Se fossem hamsters, comeriam suas crias, ou as abandonariam se alguém pegasse nelas antes de determinado período de tempo. Eu já disse que não dói em mim, e todos aqueles capazes de mandar a uma mãe fotos de sua filha assassinada também pensam do mesmo jeito; fazem isso porque não dói neles.
Bem, talvez não haja tanta diferença assim.
Mas continuo acreditando que aqueles dementes são humanos. Seu cérebro mais complexo é capaz de muito mais. Só que eles não parecem saber disso.