Contos de fadas

Comentário do Luiz Carlos Checchia:

Concordo contigo sobre os problemas de conteúdo nos contos infantis. Mas por outro lado, há um aspecto importante a sabermos: os contos não nasceram infantis, eles fazem parte de um longo processo de elaboração e reelaboração de mitos e lendas, a mairia vinda da idade média européia. E aí e q entra o caroço do angu, essas histórias são fundamentais p a formação e a compreensão de nossa mentalidade, por outro lado, há realmente a preocupação com os conteúdos. Pergunto: como lidamos com isso? É correto jogar p o limbo esse manancial de informações q são os contos de fadas e, ao fazer isso, não estamos jogando p depois explicações q os adultos devem dar às crianças sobre os erros q cometemos? Não seria maquiar o mundo? Por fim, os contos de fadas já não nos serve, de uma maneira ou outra, como metáforas desses erros, e q jogá-los fora seria simplicar demais agora coisas q se complicarão no futuro? Não sei as respostas realmente, mas gostaria de saber… Estou atento p outras formas de pensar…

O Luiz fez boas perguntas.

E, assim como ele, eu não sei as respostas.

Por um lado, este é um mundo mais complexo que aquele que os irmãos Grimm conheceram. Mas não sei se é pior; aquela era uma vida dura, grosseira. As cidades do interior da Europa, em um eufemismo, podiam ser definidas como brutas, com muito pouco daquela imagem idílica que associamos ao campo coalhado de vaquinhas holandesas e com a Heidi subindo a montanha correndo e gritando “Vovô! Vovô!”.

Há uma diferença entre a violência que a gente vê na TV e a real. E às vezes tenho a impressão de que o tipo de violência a que crianças estavam expostas naquela época era muito pior, por mais próxima. E acho que um mundo diferente pede versões diferentes dos contos de fadas.

Claro que nenhum pai com algum juízo tem a pretensão de achar que pode proteger os filhos do que julga ruim ou perigoso no mundo; e nem mesmo sabe se isso é bom. Tudo isso vai chegar às crianças mais cedo ou mais tarde. Mas há pequenos limites que ele pode traçar.

Acho que os contos de fadas têm uma grande função, a de estabelecer guias para o comportamento. Disciplina, amor ao próximo, cordialidade, coragem são virtudes que, pelo menos na minha opinião, devem ser transmitidas. E isso pode ser feito sem os detalhes que acho mais fortes. Por exemplo, não vejo razão para que eu, um pai divorciado, fale que João e Maria foram jogados pelos próprios pais no mato para morrerem de fome. Nem em dizer que o Lobo Mau mastigou a vovozinha: a principal mensagem — obedecer aos pais — não precisa dela. Eu, pelo menos, ouvi a história assim, com o lobo trancando a velhota no armário. E gostei tanto que ainda lembro dela 30 anos depois. Não pode ser tão ruim assim.

Enquanto minha filha achar interessante a história, dessa forma, é assim que ela vai ser contada. Não acho que isso vá demorar muito, mas aí terá sido ela quem decidiu o tempo certo.

No fundo, é tudo uma simples questão de escolha, de decidir o que você vai fazer. Nessas horas, teorias contam muito pouco: a prática e a convivência com as crianças é que determinam o que deve ou não ser dito. É por isso que acho que não há uma resposta para essas perguntas (é assim que eu disfarço a minha burrice, dizendo que não há respostas). Dentro de muitos limites, é possível tentar tornar esse processo de crescimento um pouco mais saudável e gradativo.

No fundo, a gente faz o que pode e o que acha certo.

Ossos do ofício

Há alguns anos, tive dificuldades para aprovar uma campanha que eu achava excelente. Não que o comercial, base da campanha, fosse absolutamente brilhante, mas era doce e extremamente pertinente. Eu sabia que ele era fundamental para o posicionamento que eu tentava dar ao cliente, que atendia há um ano e que atenderia por mais um.

Quando apresentei o roteiro, um dos diretores da empresa reclamou da faixa etária dos protagonistas do comercial. Queria adolescentes no lugar das crianças que eu tinha escolhido. Disse que eu já tinha usado crianças antes e que esse não era exatamente o público-alvo deles.

Eu bati pé — é imaturidade discutir do modo como eu discutia com clientes, mas eu era imaturo. Meu moral estava alto e eu podia ser.

O filme falava sobre primeiro amor e separação. Se eu fosse colocar adolescentes no lugar de crianças ele ficaria caricato — cá para nós, um sujeito que vive um primeiro amor ingênuo e absolutamente platônico aos 17 anos não é um modelo a ser seguido, é só um retardado emocional. Mas não teve jeito: o comercial só seria aprovado com os tais adolescentes. Não adiantou dizer que o comercial perderia toda a verdade: adolescentes.

Fui gravar o comercial em outro Estado e, naturalmente, fiz como achava que deveria ser feito. Com duas crianças.

O resultado foi que o comercial se tornou um sucesso. Sustentou com folga a (excelente, por sinal) estratégia de crescimento do anunciante, aumentou seu índice de recall, deu a eles uma aura de classe que antes não tinham. O sucesso foi tão grande que aquele diretor, satisfeito com o resultado, comentou que eu não fazia idéia do sucesso que o comercial iria alcançar.

Ao dizer isso não sabem das horas de desespero diante de fitas e mais fitas de agências de modelos que não tinham o que eu queria. Não fazem idéia do sacrifício que foi escolher uma nova música depois que me cobraram 25 mil dólares por uma canção desconhecida de Smokey Robinson. Ou das minhas ameaças de morte a São Pedro para que o bendito parasse a chuva.

Mas o ruim, mesmo, é que esse comentário passava por cima, conscientemente, da aposta que fiz e da minha desobediência. Ou teimosia, chame como quiser. Era um modo sutil de retirar a minha responsabilidade sobre os resultados.

O elogio não era um elogio. Se eu estivesse errado e aquilo não desse certo, eu podia ir procurar emprego como vendedor de sapatos, porque a culpa seria toda minha. Como deu certo, era porque eu não tinha idéia do que estava fazendo.

Tudo bem.

Há alguns dias me disseram que o comercial estava voltando ao ar. Razão: desde que deixei de atender o tal cliente não fizeram nada tão bom.

Acontece que reviver um comercial de 5 anos atrás é uma burrice sem tamanho, porque o momento é outro, o mercado é outro. Campanhas devem permanecer por muito tempo; peças isoladas, não. E a campanha deles mudou há muito tempo. Era impossível que aquele filme voltasse a fazer um décimo do sucesso original (“Ah, lá vêm aqueles meninos chatos de novo!”).

Por sorte, desistiram de veicular o comercial por causa dos direitos de imagem. Para eles foi bom, mas eu já estava esperando ver a falta de impacto e ouvir o comentário: “Eu sempre disse que deveríamos ter usado adolescentes”.

Os outros

Qualquer pessoa que tenha trabalhado com programas de desenvolvimento sabe o quanto é difícil lidar com as populações ribeirinhas.

E por isso que a maioria desses programas, mesmo quando conseguem a rara virtude de serem sérios e honestos, fracassam.

A razão de tudo está na maneira de pensar. A mentalidade capitalista avançada que se vê nas cidades não existe para aquele que vive à beira do rio.

Se ele sai para pescar, não interessa se os peixes estão pulando para dentro do barco. Se ele vir que tem peixe suficiente para comer por alguns dias, e algum para vender e comprar farinha e cachaça e para jogar dominó, ele dá o dia por encerrado.

Ele está certo.

Continho feminista

E-mail recebido:

Era uma vez, em uma terra muito distante… Uma princesa linda, independente e cheia de auto-estima. Deparou-se com um sapo enquanto contemplava a natureza e pensava em como o maravilhoso lago de seu castelo estava de acordo com as conformidades ecológicas.

Então um sapo pulou em seu colo e disse:

– Linda princesa, eu já fui um príncipe muito bonito. Uma bruxa má me jogou um encanto e eu me tornei esse sapo asqueroso. Um beijo seu, no entanto, há de me transformar de novo em um belo príncipe e poderemos nos casar e constituir residência em seu lindo castelo. Mamãe poderia vir morar conosco e você poderia preparar meu jantar, lavar minhas roupas, criar meus filhos e seríamos felizes para sempre…

Naquela noite, enquanto saboreava umas pernas de sapo à sautée, acompanhadas de um cremoso molho acebolado e de um finíssimo vinho branco, ela riu e pensou consigo mesma:

– Nem morta!

Bonitinho, mas que me deixou pensando em como este mundo é injusto. A ricaça aí pôde se dar ao luxo de mandar um sapo falante para a panela (eu pensava que eram as rãs que a gente comia e que sapos eram venenosos, mas em parábola feminista a gente tem que relevar certas coisas). Enquanto isso, as pobrezinhas mal aquinhoadas pela Providência têm que se virar beijando tudo quanto é sapo, alguns com mau hálito, outros com aquela linguona bushiana que mira o esôfago, sem sequer poderem se dar ao luxo de comer os coitados, na esperança improvável de que pelo menos um deles possa vir a ser um príncipe encantado.

É a tese da Caitlin Flanagan: a tal emancipação das mulheres é pouco mais que a emancipação das mulheres ricas.

As alegrias que o Google me dá (V)

E mais uma vez recorro ao truque sujo de arranjar assunto recorrendo aos meus referrers.

daniela mercury meu plano site .org
O seu eu não sei; mas o meu é sair na calada da noite arrombando lojas de discos e quebrando todos os CDs dela que encontrar.

modo de vida dos italianos fotos
Eles acordam, comem pizza, passam a manhã no Coliseu, almoçam pizza, passam a tarde andando de lambreta pela Via Vêneto ouvindo Rita Pavone, jantam pizza, fazem saliência com a Sophia Loren e dormem depois de assistir a um filme de Fellini. No outro dia, a mesma coisa.

jackson pollock biografia
Nasceu, bebeu, pintou, bebeu, morreu.

como era a vida nas fazendas de cana naquela época
Mais um exemplo da tese “o – Google – é – meu – amiguinho – imaginário”. Mas acho que nem ele sabe que o significa, exatamente, “aquela época”. Se está se referindo ao século XIX, isso depende. A dos senhores era boa, apesar dos limites de um país agrário. A dos escravos era uma merda, graças aos limites de um país agrário. No geral, a vida era como rapadura: era doce, mas era dura.

mensagem subliminar irmão urso
Eu pensava que esse era o segredo mais bem guardado da indústria cinematográfica, mas já que que vazou, vamos lá: se você rodar o filme de trás para a frente, a 12 quadros por segundo, na hora em que Koda enche o saco do outro pela quadragésima sétima vez (aproximadamente depois de 30’47”), ouvirá nitidamente a voz de Steve Jobs dizendo “A era da animação tradicional acabou e o futuro pertence à CGI”.

piada queixa estupro você tem
Tenho não, fio… Serve piada de papagaio? Era uma vez um papagaio que morava num bordel…

significado palavra pederasta
Viado. (Na verdade a palavra tem origem grega e diz respeito à relação de um mestre e seu discípulo. Tem a mesma origem de pedagogia.)

comida de cowboys texanos
Taí, essa curiosidade eu também tenho. Em princípio deve ser feijão, milho e carne, mas eu não faço a mínima idéia.

fotos da vizinha trepando
A do 702 ou a do 304? A do 702 é mais gostosinha. Mas a do 304 entende mais do riscado.

resumo de livros raymond chandler
Um crime é cometido. Phillip Marlowe investiga. Phillip Marlowe leva porrada. Phillip Marlowe leva mais porrada. Phillip Marlowe leva ainda mais porrada. Phillip Marlowe resolve o caso e a gente fica com um travo amargo na boca, acreditando um pouco menos na humanidade.

qual a importancia da nova tequinologia do mundo atual
Ahn… Possibilitar que você rode o Houaiss no seu computador e evite alguns pequenos erros?

restaurante grego salvador brasil
A pergunta mais hedionda que eu já li. Alguém que procura um restaurante grego em São Salvador da Bahia de Todos os Santos, terra de Camafeu de Oxóssi, Maria de São Pedro e Dadá, só pode ser um monstro de perversidade.

marketing é ciencia
Meu Deus, por que ainda tem tanta gente que acredita nisso? Marketing não é ciência, a não ser que seja a ciência de enrolar alguém. Marketing, quando muito, naqueles momentos realmente inspirados, é arte. E olhe lá.

orgias com meu marido
Que pessoa doente. Como alguém pode pensar em fazer orgias com o marido? Orgia se faz com o amante, minha amiga; se faz com desconhecidos. Fazer orgia com o marido é desmoralizar a sacanagem.

blog do rafael galvão redator
Ei, sou eu! Sou eu!! Olha pra cá, sou eu!!!

Método Altamirando de Produção Dialética de Conhecimento

O melhor método de se angariar conhecimento que eu conheço é o “Método Mirinho”.

Altamirando, codinome Mirinho, é um dos personagens de Stanislau Ponte Preta, sobrinho pouco dileto de tia Zulmira. É o típico malandro carioca, nascido em 1926 — um ano tão estranho que até o São Cristóvão foi campeão carioca.

O método que ele desenvolveu é simples e está detalhado em “Primo Altamirando e Elas”.

Imagine-se, por exemplo, à mesa com um grande nutricionista. Você faz pose de sabe-tudo e fala bem alto: “Me passa a farinha aí que eu preciso de proteína”.

Se ele honra as calças que veste, vai fazer questão de lhe explicar que você está errado.

E é aí que entra o Método.

Cabe a você, nessa hora, olhar para ele com insolência e superioridade. Deixe claro que sabe mais que ele, que acha que ele está falando uma imensa besteira. Acompanhe seus principais argumentos com um sorriso de deboche. Levante uma sobrancelha, e apenas uma.

A cada gesto seu ele vai se irritar mais e mais, e vai fazer questão de derramar sobre você tudo o que sabe sobre o assunto.

O método, eu garanto, funciona como nenhum outro. Você não vai ganhar nenhum concurso de simpatia, claro, mas a busca pelo conhecimento vale qualquer sacrifício.

Esses breves momentos na vida

Quando comecei a ouvir Beatles era uma maravilha: sempre tinha algo novo, alguma música que eu não conhecia. Durante anos, cada novo disco era uma experiência nova, algo que eu descobria.

Quando isso acabou a pirataria manteve um pouco dessa sensação de descoberta. Mas até isso acabou um dia, porque mesmo que eu não conhecesse determinada gravação já podia dizer com certeza absoluta em que época ela foi gravada, talvez até quem tocava o quê. E eu sempre senti falta daquela sensação.

Dia desses, assistindo de novo ao show dos Beatles no Budokan, Japão, 1966, eu consegui sentir isso de novo.

O show é curioso, porque é um dos poucos em que o barulho dos fãs não torna tudo praticamente inaudível. Os japoneses são educados. O show mostra o cansaço da banda (que pararia de tocar ao vivo ao fim daquela turnê), o que a cara de tédio de Ringo torna inegável, a vocação de McCartney para animador de auditório (Lennon diria depois que ele estava se borrando de medo por causa de umas ameaças de fundamentalistas japoneses, que consideravam um show dos Beatles no templo do sumô uma afronta imperdoável à cultura nipônica), e a atitude de “vamos fazer o básico, pegar o dinheiro e ir embora daqui” de Lennon. Mostra também, não importando o que hagiógrafos passaram a dizer depois de sua morte, que Harrison era um péssimo cantor.

Os Beatles inventaram o que hoje se entende por show de rock. E, naturalmente, eram obrigados a enfrentar inúmeras situações de amadorismo. Mesmo no Japão, terra da organização, não é diferente: os microfones dão choques, não param quietos. Profissionais, os Beatles se limitam a passar o show tentando ajeitar as coisas.

Mas foi graças a esse problema que eu pude ver algo novo. Quando eles cantam Baby’s in Black, McCartney e Lennon dividem o mesmo microfone defeituoso. McCartney tenta colocá-lo na direção correta. Mas ele insiste em se mover, justamente no momento em que eles cantam “oh, dear, what can I do“. E a expressão e a modulação de voz de McCartney nessa hora são impagáveis. Para mim é novidade, porque mesmo tendo visto o show algumas vezes, eu não tinha percebido.

É uma bobagem, eu sei. Insignificante. Mas são essas coisinhas pequenas que fazem a vida valer a pena.