Passei rapidamente por Salvador há duas semanas. Queria ir ao Bonfim comprar um novo escapulário. Mas achei que minha filha não ia gostar muito dos ex-votos, e sabia que não conseguiria entrar na igreja sem que ela os notasse. Para ela a Igreja de S. Francisco (“Toda de ouro?!”, ela arregala os olhos) seria muito mais interessante.
Passei mais de 10 anos sem ir ali. A visão das pernas, braços e cabeças de parafina e plástico, as fotos de misérias humanas concebíveis e inconcebíveis, tudo aquilo não dava, a mim, a sensação de gratidão pela graça alcançada, e o conseqüente reforço da fé. Era justamente o contrário: a visão de um mundo de dor e sofrimento que desliga qualquer um da noção de Deus. A Sala dos Milagres me deixava com uma sensação que deve ser muito semelhante à claustrofobia.
Da última vez que fui lá ela tinha sido saneada; os ex-votos mais impressionantes tinham sido mudados para o andar de cima e, embaixo, ficaram apenas objetos e fotos quase inocentes.
Mas a lembrança dos ex-votos do Bonfim não sai da minha cabeça.
Não fosse por isso, de todas as igrejas da Bahia a do Bomfim estaria ali, no meio-termo. Para mim há igrejas mais interessantes; uma delas é a do Rosário das Mercês, cuja nave central tem uns poucos metros, mutilada quando abriram a Avenida Sete no início do século passado. É um dos poucos casos de igreja destruída por outra religião que não era deística, mas secular: a do progresso. (Há outro caso parecido, a da Igreja da Ajuda, construída na época de Tomé de Souza e demolida e reconstruída do outro lado da rua no começo do século XX; e Jorge Amado credita a demolição da antiga Sé, cujos alicerces são hoje sítio arqueológico ao lado do Belvedere, à ganância da empresa de bondes da época.)
Ou a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, uma das mais conhecidas de Salvador por ficar no Pelourinho, e que abriga um cemitério de escravos.
O mais engraçado é que a maioria dos baianos sabe quase nada sobre suas igrejas. E o pouco que sei aprendi simplesmente me aproveitando dos grupos de turistas que contratavam guias: eu, menino, quando me batia com um desses grupos ficava por perto e ia aprendendo. Foi o meu modo de receber educação pública e gratuita de qualidade.
Eu devia ir mais ao Bonfim. Deveria ser obrigação de filhos pródigos de Oxalá como eu.
Olá. Gostaria muito de conhecer a Bahia. Mas infelizmente acho que isso está longe de acontecer. Frequente mesmo lugares religiosos. É bom nos apegarmos a seres superiores. Lindo blog viu? Textos muito bem escritos. Abraços e uma excelente semana para você.