De prosa e poesia

Escrever prosa de qualquer tipo é difícil — por mais que aqueles que não sabem achem que não. É preciso um mínimo de domínio da língua para escrever, digamos, dez laudas.

Mas escrever cinco ou 15 versos se tornou muito fácil. Antigamente a exigência da métrica e da rima limitava bastante eventuais esforços de poetas ruins, e tornava mais simples sua classificação. Recorrência de rimas pobres, métrica capenga, tudo isso eram sintomas infalíveis de má qualidade. Mas com o verso livre isso acabou.

Desde que Pessoa conclamou todos os poetastros do mundo a se expressarem (“Não sou nada, nunca serei nada, não posso querer ser nada; à parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”), mais e mais pessoas passaram a acreditar que poderiam escrever poemas.

E podem. Difícil é escrever poesia.

O maior problema é que boa parte das pessoas acha que poemas são um bom substituto para o divã de um analista. Talvez sejam; essa, no fundo, é a base de uma das principais teses românticas sobre arte. Mas se a dor de cada ser humano é única e valiosa, nem por isso ela se torna interessante para mim. Não é todo mundo que pode desabafar poesia. (Eu, por exemplo, não posso: só sei desabafar palavrões.)

Talvez por isso tenho às vezes a falsa impressão de que a poesia é um gênero que está morrendo, como as bolsas Louis Vuitton estão morrendo por causa dos camelôs que vendem cópias falsificadas nas calçadas da Visconde de Pirajá. A cada ano as prateleiras são inundadas por novos livros de poesia — alguns bons, a maioria simplesmente dispensável, alguns ruins de doer. A porcentagem de bons poetas parece cada vez menor.

Se bem que talvez isso seja apenas a volta da criança que existe em mim. Eu detestava poesia. Só aprendi a gostar após ler um dos poemas mais brilhantes de García Lorca, “Pranto por Ignacio Sanchez Mejías” (descobri dia desses que o Zuenir Ventura também, coincidência agradável). Pode ser também apenas a minha dificuldade em analisar poesia por padrões concretos. Para mim é difícil dizer o que faz de um poema uma boa obra.

Se for a volta da criança, sou obrigado a achar que aquele papo de deixar viva a criança que existe em você é pura bobagem.

Primeiro Emprego, à alemã

A versão alemã do Primeiro Emprego está funcionando. Uma lei de lá exige que toda empresa tenha um estagiário para cada 15 funcionários.

Mas ainda é pouco. Para garantir o bom funcionamento da economia, o governo alemão está planejando aplicar multas também aos bordéis legalizados que não seguirem essas regras.

Agora que se imagine um distinto senhor chegando a um desses bordéis.

“Ô, minha filha, o que é isso?”

“Ahn… Hmmmmfff… Gasp. Não é assim que se faz? Desculpa, senhor. Acho que minha supervisora ensinou errado.”

Ou:

“O gue gue eu vazo gom izo?”

Ou:

“Espero que o senhor não se incomode se a Frida assistir. Ela é trainee. Frida, pára de rir. Não, senhor, ela não está rindo do tamanho do nosso amigo aí, não. Pára de rir, Frida.”

Ou:

“Me dá um minutinho? Deixa eu dar uma olhada no manual. É que eu estou começando hoje… Procedimento um: ‘deitar-se de acordo com o desejo do cliente’. De costas, o senhor disse? Certo. Procedimento dois: ‘abrir as pernas’. Aqui não diz o ângulo, mas acho que assim está bom, não? Mais? Senhor, mais e eu arrebento tudo aqui. Tá bom, deixa eu tentar. Procedimento três: ‘passar as pernas em volta do cliente e cruzá-las em suas costas’. Ah, mas isso parece tão difícil… Como? Ah, assim? Poxa, é tão fácil! Eu já tinha feito isso antes, e de graça! Se soubesse que era assim tinha caído na vida antes. Esse manual é que complica tudo, o senhor não acha? Agora deixa ver… Quatro: ‘abraçar o cliente’. Moleza. Como o senhor deseja ser abraçado? Senhor? Senhor? Volte aqui, senhor! O procedimento seguinte é o da língua! Volte aqui!”

Estagiárias terão promoção imediata quando conseguirem lidar com aqueles clientes mais difíceis. Por exemplo, quando colocarem aquele sádico de quatro e o encherem de porrada, ou quando conseguirem gorjeta de Isaac Muhammad.

Já as meninas que resolverem ler revistas durante o trabalho serão sumariamente dispensadas. Em compensação, os melhores bordéis darão cursos de especialização, como “A Arte de Abocanhar”, “Os Significados do Gemido” e “Como Mexer e Remexer”. Recomenda-se às estagiárias apenas não perguntar com cara de espanto: “Nossa, e isso ainda cresce?!”

Este blog espera que, com o novo incentivo do governo, o fino negócio da prostituição cresça exponencialmente na terra do Anjo Azul. E assim o governo estará fazendo sua parte no processo de desenvolvimento da Alemanha. Que poderá, orgulhosamente, adotar o singelo slogan “É sempre um negócio fazer prazer com você”.

Atlântida

Quem estava vivo nos anos 70 lembra de Erich von Däniken, que embolsou uns trocados nos perguntando se eram os deuses astronautas e falando de lendas milenares como Atlântida.

Agora um americano está iniciando uma expedição para explorar a Atlântida, que segundo ele está perto da ilha de Chipre.

A lenda de Atlântida é interessante, mas para mim é principalmente uma lenda. É bem provável que tenha existido uma cidade com esse nome, mais rica e sofisticada que as outras. Há uma referência a ela em Heródoto, e a idéia de uma civilização avançada sempre empolgou os visionários. Mas no século XX a Atlântida passou a ser muito mais que uma Pompéia afogada. Para alguns foi fundada por extraterrestres. Para outros, são os próprios extraterrestres.

A Atlântida é um dos bons retratos de uma certa relutância esquisita em admitir o valor intrínseco da civilização humana e, ao mesmo tempo, ignorar indícios históricos. As pessoas ouvem falar em civilizações avançadas e usam seus padrões para julgá-las; então Atlântida poderia até ter discos voadores e fontes desconhecidas de energia. A imaginação se sobrepõe de forma insana à razão, então, e eles sequer param para imaginar o que seria uma civilização avançada na Idade do Bronze.

A essa altura da vida, às voltas com o ET de Varginha e com casos repetidos de abdução e de aparições do Abominável Homem das Neves, não me impressiona que alguém acredite nisso; me impressiona é que achem financiadores. Isso é injusto. Há anos venho procurando financiamento para construir um harém particular e até hoje não consegui um tostão. E a verdade é que o harém é muito mais factível do que acharem Atlântida.

E respondendo à pergunta de Von Däniken, independente de existirem ou não, os deuses são o resultado de muito mescal.

O outro lado

Se você achou aquelas fotos do menino iraquiano com um cartaz de papelão na mão bonitinhas, agora é hora de conhecer estas fotos aqui.

São um lembrete cru de que a guerra não é exatamente um episódio de “Guerra, Sombra e Água Fresca”. Nem a cobertura da CNN, para ficar apenas no campo da ficção.

Guerra é morte, destruição, terror e maldade.

Notícias estranhas em um blog esquisito (IX)

Pesquisadores holandeses afirmam que a razão pela qual os erros dos outros nos incomodam tanto é porque afetam as mesmas áreas cerebrais que usamos quando cometemos os nossos próprios erros.

Mas os erros dos outros não me incomodam, a não ser quando me afetam. Se bem que os meus também não.

É, acho que os holandeses têm razão.

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Uma alemã foi levada a julgamento por seu vizinho sob a acusação de que riu muito alto durante um jantar de quatro horas com alguns amigos.

É o tipo de coisa que só acontece na Alemanha, país meio esquisitinho em que todo mundo se leva a sério demais. Ainda mais quando se fica sabedo que o litigante é um cinquentão desempregado e provavelmente com um péssimo humor. Mas mesmo lá um juiz é obrigado a arquivar o caso alegando que não se pode banir o riso.

E, provavelmente, a mulher processada saiu rindo — mais alto — da cara do vizinho maluco.

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O que faz de um inglês um inglês?, perguntou uma pesquisa.

A resposta: peixe com fritas, chá e a Rainha, de acordo com os bretões.

Eles só esqueceram de citar um grau mais ou menos inofensivo de maluquice e a disposição para fazer pesquisas imbecis.

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A imprensa norte-coreana está dizendo que muitos cidadão morreram de uma “morte heróica” quando, durante a explosão do trem na semana passada, voltaram aos seus apartamentos em chamas para salvar retratos do presidente, Kim Jong-il, e do seu pai.

Depois de rir da capacidade dos jornais de mentirem tão descaradamente, uma coisa fica no ar. É impressão minha ou a imprensa coreana está ficando cada vez mais parecida com a americana?