Fast food chauvinista

A Dani reclamou das “mulheres industrializadas” do Big Brother.

Não assisto o programa, por não ter saco (mas tive a sorte de ver o final do primeiro, com o choro daquele retardado) e por estar pouco interessado na vida dos outros; parto do princípio de que são chatas como a minha.

Mas mulheres industrializadas devem ser legais.

A gente come, come, e quando acaba pode ir buscar outra igualzinha no supermercado.

Marte I

Olhe bem.

Isso é Marte.

É pior que a pior cidade que você já conheceu.

É pior que o Saara, Atacama, Gobi e o Raso da Catarina juntos.

É um buraco inóspito, monocromático e pedregoso no meio de um sistema solar insignificante.

Marte, meu amigo, é um nada sem a mínima graça, sem nenhum atrativo.

É o último lugar onde você gostaria de passar suas férias. Se você morasse em Marte dedicaria sua vida a tentar achar uma saída, com mais urgência do que tentaria fugir do inferno.

Foi com isso que a imaginação universal perdeu seu tempo durante um século?

Marte II

Depois da decepção diante do deserto marciano, é bom olhar a foto mais uma vez.

O espaço sempre foi um sonho humano — talvez o mais grandioso deles, por parecer inacessível. Grandes sonhos são os impossíveis: como dizia Borges, “a um cavalheiro só interessam as causas perdidas”. E nenhuma parecia mais perdida que a conquista do espaço.

No século passado o sonho ficou mais próximo. Foi quando pareceu possível pela primeira vez, quando o homem percebeu que sim, que ele poderia desafiar defintiivamente a gravidade e ultrapassar a última fronteira. Algo nos seres humanos foi atiçado, então, e uma chama nova foi acesa. Depois de Gagárin as crianças puderam sonhar em ser astronautas.

As fotos de Marte dão, pela primeira vez, uma sensação de familiaridade ao espaço. Não é algo exótico e distante como os anéis de Saturno; a partir dessas fotos o espaço nos parece conhecido, parece ter uma simplicidade terrestre a que já nos acostumamos. Agora podemos fazer analogias mais simples com o que parecia tão distante.

Ainda que Marte seja um deserto árido e desagradável, essas primeiras fotos em cores trazem o espaço para a janela de casa. O espaço é logo ali.

Nostalgia e futuro

Não sei se isso é indicativo do caráter brasileiro, mas é curioso que o país jamais tenha produzido um grande autor de ficção científica como Jules Verne, H. G. Wells ou mesmo Arthur Clarke.

É uma conclusão precipitada, claro: mas essa deficiência poderia mostrar que o nosso talento estaria mais na nostalgia do passado do que na expectativa ansiosa e visionária do futuro. Como se o passado, sempre dourado pelas lentes do tempo, fosse mais interessante que o desconhecido que nos aguarda.

Um viva à repressão

A Dani escreveu um post sobre a falta de educação do carioca.

É um ponto de vista interessante. Não conheço Recife o bastante para para dizer que a cidade é isso ou aquilo (só para dizer que não gosto muito dela), mas não acho o carioca o povo mais mal educado do mundo. Reclamam do trânsito carioca, mas ele é muito melhor, por exemplo, que o sergipano, onde as pessoas estacionam no lado direito das avenidas e dirigem pelo meio da rua, e têm uma cegueira esquisita para pedestres, ainda que estejam bem à sua frente.

Mas não é essa a questão. O povo do Rio faz xixi na rua? Bobagem: o baiano faz cocô. E o xixi na parede é praticamente uma instituição baiana, tornando-se obrigatório durante o carnaval e festas de largo.

Diacho, ainda não é essa a questão.

É a seguinte: respondendo a um dos comentários, ela fala que isso é o resultado da “falta de repressão”.

É engraçado como nós reagimos imediatamente ao uso dessa palavra. Repressão lembra duas ditaduras sanguinárias, a de Vargas e a de 64, pontos mais baixos em um país que entre o II Império e a Nova República não conseguiu um período longo de estabilidade institucional. Faz parte também da própria natureza ibero-americana, fidalga e individualista. Nossa primeira reação é repugnância, achar que pedir repressão é demais. Somos os alegres donos de um espírito falsamente libertário.

O pior é que estamos errados, e essa má compreensão do conceito de repressão é provavelmente uma das causas da sensação geral de que este é o país da impunidade.

Repressão não quer dizer, necessariamente, ditadura. É um instrumento da sociedade, se é que podemos chamar assim, para a regulação de interesses conflitantes. Um sinal de trânsito é um elemento de repressão; uma multa também.

Um Estado não precisa ser policial para reprimir quem comete pequenas contravenções. É até uma necessidade. Eu, pelo menos, estou convencido há muito tempo que tolerância com bobagens como estacionar na calçada são o primeiro passo para tolerar “deslizes” maiores. Se eu posso cometer uma pequena infração, é inevitável que eu tente cometer uma maior. E vou esperar que a tolerem, também, alegando que “se posso aquilo também posso isso”. Faz parte da natureza humana.

A falta de repressão a esses atos progressivamente mais nocivos vai esgarçando aos poucos o tecido social, que incorpora essa noção como natural. O carioca, mais especificamente, parece ter uma espécie de culto à malandragem, à “ixperteza”, uma mania de achar a bandidagem, quando não admirável, algo com o que se pode conviver naturalmente. Essa atitude torna tudo mais difícil, porque a ideologia dominante passa a ser a de que o importante é não ser pego. Mas isso vale para todo o país.

Um sistema mais eficiente e, portanto, mais repressivo provavelmente ajudaria a fortalecer a idéia de comunidade. É curioso que só os mais pobres morem em “comunidades”. Há uma questão semântica interessante aí, a idéia de que esse papo de comunidade é para pobre, de que rico está acima disso.

A noção de repressão deve nascer da noção de que todos têm os mesmos direitos e deveres. Ela serve para garantir que eles sejam respeitados. É simples.

A impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice

O nome dela era Vanderlice, tenho quase certeza. Era uma catarinense loura, olhos talvez azuis, seios balouçantes livres de importuno sutiã, uma impressionantemente volumosa bunda redonda sempre em shorts folgados e minúsculos, tão ciente era a moça de suas graças. Corria o verão de 1988 e estávamos em Petrópolis, no congresso nacional da União da Juventude Socialista, ao qual cheguei inconsciente por excesso de sangue na corrente alcoólica. Sem dinheiro, enfadado por todo aquele blá-blá-blá, eu e dois amigos fundamos uma dissidência política: a UJA, União da Juventude Aloprada, instrumento popular revolucionário que se dedicava a ser o mais demente possível enquanto era expulsa de boates que não podia pagar. Petrópolis era uma cidade tão enfadonha. Para não dizer que estávamos totalmente à parte do processo político, assistimos a uma palestra sobre sexo (claro que porque a impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice estava lá, tentando acomodar sua exuberância calipígia em medíocre e falta cadeira). Um de meus amigos, comovido pela impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice, fazia insistentes perguntas sobre sexo anal, enquanto todos nós contemplávamos ostensivamente o óbvio motivo de suas singelas dúvidas. Infelizmente, na noite daquele sábado, a impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice agraciou outro sujeito, um paulista que não me parecia capaz de apreciar devidamente o maná caído em suas mãos. Mas na plenária final, no último dia, sentado a sudeste da impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice enquanto tentava convencê-la — sem sucesso e com excesso de tato, lamento admitir — de que prazeres inauditos e celestiais a aguardavam naquele paraibinha com cara de bobo, eu tive a minha redenção: ao apoiar firmemente no chão suas mãos e seus joelhos para se levantar em uma votação, a impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice se revelou em toda a sua glória e exuberância diante de mim, a um ínfimo palmo destes pobres olhos que por fim encontravam sua razão de ser. E é por isso, por esse único momento fugaz e tão desgraçadamente transitório, que jamais me será possível esquecer a impressionantemente volumosa bunda redonda de Vanderlice. Boas lembranças e diamantes são para sempre.

Depois do tiroteio

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Se Deus está morto eu não sei, porque Ele não me convidou para o Seu funeral, me privando da chance de tomar uma coca-cola com Santo Agostinho. Mas Nietzsche, com certeza, está: esta é sua máscara mortuária.

Na batalha entre os dois, parece que Deus levou a melhor. Nietzsche não pode fazer como Moreira da Silva e dizer que “até hoje ninguém sabe quem morreu; eu garanto que foi ele, ele garante que fui eu”. A prova está aí.

Marketing viral

Estou sempre recebendo anúncios, enviados por amigos.

São comerciais e anúncios engraçados, que circulam o mundo até que alguém ache que eu vou gostar.

O que as pessoas que me mandam esses anúncios não sabem é que estão participando de uma modalidade de marketing relativamente nova, chamada “marketing viral”.

Ou seja: os criadores esperam que os anúncios se espalhem pela Internet como vírus, multiplicando-se de mailbox em mailbox. Alguns dizem que esse é o futuro da propaganda.

Falo isso porque hoje recebi uns bons anúncios da Brahma Light, em resolução aceitável. Pelo visto foram concebidos exatamente para serem distribuídos por e-mail.

Antigamente as pessoas cobravam para veicular propaganda. Hoje estão fazendo isso de graça. Somos todos altruístas.

Vendendo escolas

Há muito eu não comprava uma revista “Marketing”. Marketing, aquela matéria que vai ficando cada vez mais cheia de fórmulas matemáticas, me interessa cada vez menos, e não gosto da abordagem superficial demais da revista.

Mas a matéria de capa da edição de novembro me chamou a atenção: “A Comunicação das Instituições de Ensino”.

O assunto me interessa. É uma das poucas coisas que posso dizer, com certeza absoluta, que entendo muito bem. E é por isso que terminei a leitura da matéria achando que raras vezes tinha visto tanta bobagem junta.

Eis um pequeno apanhado.

O presidente da Rapp Collins (uma grande e excelente, de resto, empresa de marketing) diz:

A fidelização [do cliente] deveria começar com a própria base de dados interna, por meio de descontos progressivos para aqueles que têm mais de um filho matriculado na mesma escola, como os programas de milhagem das companhias aéreas.

Depois o pessoal reclama. Estão tentando vender geladeiras a esquimós. Poderiam fazer o favor de avisar que praticamente todas as escolas praticam esse tipo de desconto, até mesmo aquelas menos afetadas pelas crises periódicas como a que o setor atravessa atualmente?

Mas absurdos maiores são ditos pelo presidente do Instituto Monitor, que realiza um Seminário de Marketing Escolar. Segundo ele, na época do lançamento do Seminário, 1994, “o máximo que as escolas faziam era colocar uma faixa na porta informando que as matrículas estavam abertas”.

Olha que lindo: foi o Seminário que ensinou as escolas a fazerem marketing. Eu não duvidaria que tivesse ensinado Jesus Cristo a multiplicar pães e peixes. A verdade, infelizmente, é um pouco diferente: escolas — principalmente cursos livres, como pré-vestibulares — sempre investiram em propaganda, embora geralmente tenham privilegiado os investimentos em “marketing de relacionamento”, às vezes de forma meio primária. Se de alguns anos para cá o investimento em mídia aumentou não foi por causa do Seminário. Foi por causa da concorrência cada vez maior. Um bolso vazio é melhor professor que qualquer seminário.

Mais bobagens: “depois de nove anos, adquiriram alguns conhecimentos, como o de que a publicidade do ensino fundamental deve estar voltada para a família. A partir da faculdade, o cliente passa a ser o próprio aluno”.

Reforça-se a impressão que estão tentando ensinar aos seus clientes o beabá de seu próprio negócio. O que os marketeiros da reportagem apregoam como a nova novidade é algo que qualquer diretor de escola com mais de 3 mil alunos sabe muito bem. Aprendem com a vida e com a experiência de outras escolas. Eu, particularmente, poderia retificar um detalhe: o aluno passa a ser “cliente” não na faculdade, mas a partir do que eu ainda insisto em chamar de segundo grau.

Me parece que esse pessoal ainda está aprendendo o métier, aplicando conceitos gerais de marketing no segmento escolar. Nada de errado nisso; mas eles estão deslumbrados com algo muito velho. E mesmo aí falam pequenas bobagens: há a afirmação temerária de que “a mídia de massa deveria servir apenas de suporte para as demais ações” de marketing.

Isso pode até valer para alguns segmentos; mas posso mostrar o exemplo de um colégio que praticamente quadruplicou de tamanho em 3 anos — se tornando o quarto maior do país, na época — basicamente investindo em mídia de massa, e com uma ênfase clara em propaganda institucional. (Investimento executado por um dos melhores, mais bonitos e mais gostosos publicitários do país, en passant.)

Me desculpe, mas morro acreditando que mídia de massa é fundamental para criar o que eles gostam de chamar de branding. E que imagem é cada vez mais importante nesse mercado, em que a concorrência é cada vez maior e mais capacitada.

O mercado educacional é interessantíssimo. Escolas têm uma resposta quase imediata aos seus investimentos em marketing, e não oferecem espaço para enrolação. Por isso, se eu fosse dar um conselho a esse pessoal, eu recomendaria que em primeiro lugar respeitassem a inteligência dos seus clientes. Tentar ensinar um marceneiro a cortar madeira é bobagem. O melhor diretor de escola que conheci é capaz, ao ver os primeiros números de suas matrículas, de fazer uma projeção acurada do número de alunos que terá no ano seguinte. E isso acontece porque ele entende mais do seu negócio do que eu.

Se levarem isso em consideração, aposto que todo mundo vai se dar muito bem.

A propósito, acho que vai demorar muito tempo até eu voltar a comprar uma Marketing novamente.