Sempre achei que a principal razão para não ter concluído o curso de direito era o fato de me achar honesto e ético demais para ser advogado, juiz ou promotor.
Ou porque sempre achei que o exercício do direito (com D maiúsculo, como querem os “operadores do direito”, como se esse detalhe fosse dar dignidade à sua profissão) exigia a mais rasteira das inteligências, que basicamente consiste em não estragar o que os outros fizeram antes de você.
Mas agora, pensando nisso, descobri que há um outro motivo para a minha antipatia: o desprezo com que a raça trata o português. Pior: pensando que estão sendo brilhantes quando estão apenas sendo pernósticos e obtusos.
O português é uma língua gostosa como uma mulata do Pelourinho, feita para ser tratada com carinho e doçura, em diminutivos carinhosos; e não com mesóclises que mais parecem um estupro.
Logo no começo da faculdade fui obrigado a ler o livro (quer dizer, pedaços do livro) de um sujeito chamado Carlos Maximiliano. Esse macróbio é idolatrado no curso de direito, mas só porque advogados são antas ignorantes: Carlos Maximiliano foi quem arranjou o casuísmo legal que possibilitou a Getúlio Vargas mandar Olga Benário para o forninho na Alemanha de Hitler. Ele era conhecido como o “príncipe dos hermeneutas”; eu não perdia uma chance de chamá-lo de “príncipe dos apedeutas”.
Em vez de escrever, o retardado resolvia dar aulas de arcaísmo e de conhecimento da língua portuguesa. Ele não era só canalha; era um chato, e isso é pior, muito pior.
Como minha passagem pela faculdade foi pouco comum, não agüentei o dia em que minha professora leu um trecho daquele livro insuportável, em que o desgraçado se referia a ser “ofuscado pelas nuvens” de alguma coisa. “Professora, esse príncipe dos apedeutas escreve difícil, mas é burro como uma porta. Nuvens não ofuscam. Nuvens obnubilam”.
Acho que ela nunca entendeu o ponto que eu tentava defender.