Aborto é um tema delicado, Paulo.
Mas naquele post eu não estava falando especificamente sobre o aborto em si; acho que me expliquei mal. Me referia à questão legal que envolve o assunto.
Alguns acham um crime hediondo; outros não. A questão aqui não é exatamente o aspecto moral do aborto, mas sim a possibilidade daqueles que estão dispostos a fazer um de contarem com o apoio do Estado — ou, quando menos, de não serem atrapalhados por ele.
É ingenuidade acreditar que o fato de existir uma lei proibindo o aborto seja eficaz em coibi-lo, assim como seria achar que sua legalização iria incentivar sua prática. Abortos nunca foram legais no Brasil (com exceção de alguns casos bem específicos), e não consta que seu número tenha diminuído ou aumentado por isso. Porque o que faz com que uma mulher, diante de uma gravidez indesejada, decida ter ou não o seu bebê é a sua visão moral e ética do mundo, aliada a uma série de circunstâncias imponderáveis. Nessa hora ela não poderia ligar menos para o que uma lei pouquíssimo aplicada diz.
Se ela decidir pelo aborto, e for de classe média ou superior, poderá recorrer a bons médicos (bons no sentido técnico; me abstenho de fazer julgamentos morais). Em último caso, pode recorrer a dois comprimidos de Cytotech. Já aquela miserável que toma a mesma decisão terá que recorrer a soluções que muitas vezes parecem saídas de um circo de horrores. Sem falar nos abortos feitos em fetos com até 6 meses de gestação.
Pode-se achar ou não o aborto algo condenável, mas a questão é que o Estado, diante de uma realidade objetiva e bem definida, deve simplesmente parar de esconder a cabeça em um buraco na areia. Legais ou não, abortos vão continuar sendo feitos. E é bom lembrar que é dever do Estado dar o máximo de igualdade a todos; é para isso que ele existe. Por definição, o Estado é laico e é o resultado da correlação de forças da sociedade que regula.
Mas é praticamente impossível falar de aborto sem resvalar no aspecto ético. Eu, pelo menos, acho que uma mulher tem o direito de decidir o que fazer com o corpo dela; dizer que o embrião é outro ser é apenas meia-verdade, porque se fosse mesmo não dependeria do corpo dela.
(Pequena questão filosófica: uma mulher grávida tem o direito de se suicidar?)
Não acho que ninguém tenha a autoridade de dizer a uma pessoa que ela deve ter um filho que não quer.
Além disso, acho que pior que um aborto é uma criança ser criada sem amor. Orfanatos estão cheios de abortos que não foram feitos.